quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Agostinho não gostava das lições de grego

As escolas do Império Romano não eram lugares agradáveis para crianças


Se suas Confissões não mentem, Aurelius Augustinus era um bom aluno nas aulas de latim, mas um verdadeiro desastre nas de grego. Não que lhe faltasse inteligência. Era preguiça, mesmo, conforme ele próprio, depois de adulto, assumiu. Como consequência, era brutalmente espancado pelos professores, que, aliás, contavam com o beneplácito dos pais. Era assim que as coisas funcionavam nas escolas do decadente mundo romano do Século IV depois de Cristo.
Ocorre que, naqueles dias, era consenso que saber grego fazia parte da formação indispensável a uma pessoa culta, especialmente se tivesse pretensões a uma carreira de letras, magistratura e/ou política. A despeito desse fato, e das torturas contínuas na escola, o guri não conseguia meter na cabeça uma palavrinha grega que fosse. O que lhe salvava a pele era o desempenho nas aulas de latim, pelas quais tinha um grande amor, em particular no que se relacionava às obras dos principais autores, como era, por exemplo, o caso de Virgílio. 
Aurelius Augustinus nasceu em Tagaste, situada no norte da África, e que fazia parte do mundo romano. Escola, naquele tempo, era um lugar de repetição e memorização (¹), resumindo-se a didática, como regra, ao número de pancadas que cada caso requeria. Ora, o jovenzinho gostava de brincar, coisa que reputamos normal nas crianças saudáveis, mas que pais e professores daqueles dias tenebrosos desaprovavam. Contraditórios, eles, diria Aurelius Augustinus, porque reprovavam nos filhos ou discípulos aquilo que aplaudiam nos profissionais que iam ver nos circos...
Não espanta, pois, que Augustinus desenvolvesse enorme aversão à escola. Como sua mãe era cristã (²), havia aprendido a fazer orações, de modo que pedia a Deus para não ser torturado nas aulas. Mas nada de estudar! Homem feito, reconheceria que tudo que havia de mais importante, como saber ler, escrever e fazer contas, aprendera naqueles terríveis anos, ainda que desaprovasse a "metodologia" dos que ensinavam. E acabaria professor, mas isso já é outra história. Nos séculos seguintes, viria a ser conhecido como Santo Agostinho.

(1) Espero que nenhum dos leitores tenha frequentado uma escola assim...
(2) Embora seu pai ainda não fosse.


Veja também:

2 comentários:

  1. Sabe uma coisa, Marta? Provavelmente a vida dele deu no que deu porque não era submisso, porque se insurgiu... Não é este, ao fim e ao cabo, o princípio da mudança das coisas?

    Abraço

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    1. Gostei dessa ideia. Embora não fosse o aspecto central de suas Confissões, Santo Agostinho acabou fazendo observações que são úteis até hoje para quem ensina, inclusive valorizando o papel da curiosidade como fator de aprendizagem, em lugar dos castigos terríveis que, durante muito tempo, foram o meio grotesco, porém usual, para o ensino de crianças e jovens.

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