Ninho de joão-de-barro |
Na postagem Uma Planta Desobediente às Regras da Filosofia de 27 de março deste ano, tratei de como os primeiros autores que escreveram sobre o Brasil quase sempre incluíam em suas obras algumas observações sobre curiosidades tanto da fauna quanto da flora do "Novo Mundo", que se lhes afigurava tão diversa daquela a que estavam habituados na Europa. Os séculos passaram, é verdade, mas o interesse sobre esses aspectos exóticos continuou. Tanto assim que, em 1817, a Corografia Brasílica do Padre Ayres de Casal continuava a listar o que de mais extravagante podia haver entre os animais encontrados no Brasil e, dentre tantos outros mencionados, encontra-se uma simpática ave, que se vê em uma parte considerável da América do Sul - estou falando do joão-de-barro (Furnarius rufus). Naturalmente o que surpreendia nosso autor não era, por suposto, a aparência desse pássaro, aliás muito comum, mas a forma como edifica seu ninho, com tal habilidade que, se fosse mais universalizada entre os seres vivos, poderia resolver os problemas habitacionais da humanidade... Sorria, leitor, mas passe em seguida à descrição de Ayres de Casal:
"João-de-barro é uma casta de cotovia, amarelada com uma risca esbranquiçada por cima dos olhos, e só é notável pela formatura do seu ninho de barro, donde se lhe derivou o nome. É feito com muita arte e perfeição no forcado de uma árvore, e consta de um corredor com um pouco mais de um palmo de comprido, com uma sala quase do mesmo comprimento a um lado, todo de abóbada, com uma janela de permeio no fim do corredor, cuja entrada é pequena e fica sempre para aquela parte donde o vento sopra menos. Este edifício resiste às invernadas por muitos anos."
A descrição do ninho chega a ser muito interessante, ainda que, para quem nunca viu um, talvez pareça confusa. Já a classificação da ave como "uma casta de cotovia" poderia fazer arrepiar os cabelos de um ornitólogo contemporâneo, mas é compreensível para tempos em que os conhecimentos fundamentados na observação, comparação e experimentação com base científica ainda engatinhavam. Ocorre que, quase sempre, os autores podiam servir-se apenas de palavras para dar a entender a seus leitores o que era a Natureza nas Américas. A vinda de artistas como integrantes das missões científicas estrangeiras que estiveram no Brasil durante o século XIX foi importante para começar a fixar em forma de desenhos e aquarelas os contornos de seres vivos exóticos, muitos deles hoje correndo perigo de extinção. Mais tarde, a fotografia iria popularizar de vez a imagem de onças, jacarés, piranhas e outras feras mais.
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