quarta-feira, 10 de abril de 2013

Superstições no Brasil - Parte 3

Superstições na literatura brasileira: do ouro que virava carvão à sexta-feira, dia 13


Na literatura brasileira do século XIX há uma variedade de exemplos de superstições que eram, então, populares. Vão aqui apenas alguns casos.

1. Em As Minas de Prata, José de Alencar refere que, nos tempos coloniais, havia uma exótica crendice relacionada a dinheiro que alguém, para escondê-lo, havia enterrado:
"Ainda hoje há pelo interior quem acredite que o dinheiro enterrado por pessoa finada se transforma em carvão, à vontade de quem o possuiu, e sobretudo quando o acha outro, que não o escolhido herdeiro da alma penada.
Encontrando a botija, os salteadores sem dúvida acreditariam que o ouro de que estava cheia se trocara em carvão; e deixariam em paz a casa de D. Dulce. Então, quando se retirassem já aterrorizados com a superstição, esbarrariam nos quadrilheiros (¹) postados ali perto, e iriam chorar os seus pecados na cadeia até o dia do castigo."
Como veem, senhores leitores, é quase de se lamentar que tal superstição tenha perdido completamente sua força!

2. Outra de Alencar, desta vez em Til, versando sobre as explicações supersticiosas que se atribuíram à origem de uma menininho abandonado que certo dia apareceu, sobre um cavalo, no terreiro de uma fazenda:
"Como de costume, apareceram várias conjecturas e invenções, cada qual mais engenhosa. Uma velha, muito versada no Novo Testamento, afirmou que esse menino era o anticristo e o sendeiro a própria besta do Apocalipse, descrita por S. João. Outra jurava ser o caçula do diabo cocho que se metera na pele do bugrezinho, e andava fazendo estripulias pelo mundo."
Tem-se, por este exemplo, uma noção das ideias malucas que povoavam a cabeça das pessoas quando se tratava de crianças abandonadas e/ou de origem desconhecida. Era a culminação da infelicidade, vir ao mundo como um ser frágil e já em péssima situação, e ser ainda alvo de superstições cabeludas. E olhem que este não é o único caso na literatura brasileira em que há referência aos supostos maus agouros associados a pequenos que ninguém sabia exatamente de onde vinham.
Agora, Machado - para recordar duas das mais universais superstições, a do número 13 e a da sexta-feira. Vamos a elas.

3. Trecho de Memórias Póstumas de Brás Cubas:
"Referiu-lhe que o decreto trazia a data de 13, e que esse número significava para ele uma recordação fúnebre. O pai morreu num dia 13, treze dias depois de um jantar em que havia treze pessoas. A casa em que morrera a mãe tinha o número 13. Et coetera. Era um algarismo fatídico. Não podia alegar semelhante coisa ao ministro; dir-lhe-ia que tinha razões particulares para não aceitar."
Neste caso, Machado de Assis toca, de passagem, em um aspecto curioso das superstições. É que, sendo elas amplamente aceitas e mais amplamente ainda execradas, ninguém que se julgue pessoa instruída quer assumir que as acolhe. Mas é raro encontrar quem não tenha lá, sob esse aspecto, suas manias.

4. Por último, uma citação de Dom Casmurro:
"Um dia, - era uma sexta-feira, - não pude mais. Certa ideia, que negrejava em mim, abriu as asas e entrou a batê-las de um lado para outro, como fazem as ideias que querem sair. O ser sexta-feira creio que foi acaso, mas também pode ter sido de propósito; fui educado no terror daquele dia; ouvi cantar baladas em casa, vindas da roça e da antiga metrópole, nas quais a sexta-feira era o dia de agouro. Entretanto, não havendo almanaques no cérebro, é provável que a ideia não batesse as asas senão pela necessidade que sentia de vir ao ar e à vida. A vida é tão bela que a mesma ideia da morte precisa de vir primeiro a ela, antes de se ver cumprida."
Pois bem, deixando Bento (ou Dom Casmurro, como queiram) de lado, juntamente com suas neuróticas suspeitas (²), tratemos de encerrar esta postagem que, aliás, não sai nem em dia 13, muito menos em sexta-feira. Tenham, pois, um ótimo dia, senhores leitores!

(1) Assim eram chamados, segundo as Ordenações do Reino, os indivíduos com funções policiais que, à noite, vigiavam a cidade (Veja-se o Livro Primeiro, Título 73 das Ordenações).
(2) Ou nem tanto...


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