Edifício central da Estação Ferroviária de Capivari - SP |
Para muitas cidades, em especial as pequenas, a estação ferroviária foi, até por volta dos anos cinquenta (séc. XX), muito mais que um local de chegada e partida de trens. Com os trens vinham os jornais da Capital, vinham as mercadorias que abasteciam o comércio, vinham os parentes que se visitavam periodicamente. Era na estação ferroviária que funcionava o telégrafo que, além de contribuir para assegurar o funcionamento adequado da própria ferrovia, era também o instrumento através do qual as notícias podiam chegar mais depressa e, daí, passar de boca em boca entre a população da localidade.
Como se sabe, muitas das antigas ferrovias foram desativadas em décadas mais recentes, e os prédios das estações ferroviárias receberam outros usos. Em alguns casos o reconhecimento da importância histórica dessas construções levou à sua utilização como museus, centros culturais, bibliotecas. É desagradável, no entanto, quando se vê que algumas estações estão, literalmente, em ruínas.
Uma busca na lista de postagens deste blog indicará a existência de vários textos relativos à preservação da memória ferroviária. Seguindo essa linha de trabalho, estive um dia desses em Capivari, com a intenção de fotografar a pequena estação ferroviária de estilo britânico, que havia pertencido à Companhia Estrada de Ferro Sorocabana. As fotos que ilustram esta postagem darão conta ao leitor, sem a necessidade de muitas palavras, do que pode ser visto atualmente.
Decepcionante? Sim, mas nada incomum. Ocorre que, enquanto fazia as fotos, passou por ali um senhor que, parando para conversar, identificou-se como um trabalhador aposentado que, em idos tempos, transportava açúcar demerara até a estação para embarque. As informações que apresento, daqui por diante, são devidas à sua simpática contribuição.
Plataforma de embarque da Estação Ferroviária de Capivari - SP |
Explicou-me que há algum tempo havia funcionado na estação uma entidade filantrópica que já deixara o local (a placa ainda está lá). Andando pelos trilhos que ainda restam, mostrou-me uma ponte que fora parte da ferrovia e que, desativada e desmontada, fora jogada ali ao lado, onde, aliás, ainda está, quase completamente coberta de mato (pergunto-me por que, ao menos por respeito ao ambiente, não reciclam ou reutilizam o material). Ainda em pé, mas em muito mau estado, a cabine usada pelo guarda sinalizador tem abrigado usos impublicáveis. E a estação, cuja restauração é frequentemente prometida, continua lá, em estado mais que precário, à espera de que os trabalhos finalmente comecem ou que a mão do tempo acabe dando o golpe de misericórdia.
Antes que nos despedíssemos, meu interlocutor, com uma simplicidade não desprovida de bom senso e sabedoria, ainda acrescentou:
"Meus filhos sempre me falam: Pai, o senhor só tem coisas velhas pra mostrar? E eu respondo: Eu tenho coisas velhas pra mostrar, mas vocês terão o quê? Não se conserva mais nada..."
Com suas palavras, só posso concluir a postagem. O "mato grosso do Capivari", de que tratei na postagem anterior, não irá voltar nunca mais, mas essa estaçãozinha pode bem ser restaurada. Espero que seja, o quanto antes.
Veja também:
Que saudade de quando ia para piracicaba de trem com meus pais, até hoje as vezes sonho que a ferrovia voltou a funcionar
ResponderExcluirRestam, ao menos, as ferrovias turísticas. Dá pra matar a saudade e para mostrar às crianças como era viajar de trem...
ExcluirCara Marta, sei que beleza é um conceito muito relativo, mas, para mim, essa era, de longe, a estação mais bonita do ramal de Piracicaba (Jundiaí-Itaici-Piracicaba-São Pedro), hoje desaparecido. Curiosamente, ela foi construída em 1918, quando a cidade já estava em franca decadência e políticos locais estavam receosos quanto à E. F. Sorocabana fechar a estação devido ao baixo movimento da época (existia uma estação primitiva, de 1875, que foi derrubada para a construção dessa). A verdade, no entanto, era que o ramal de Piracicaba da Sorocabana foi construído nos anos 1970 do século XIX pela Ytuana, ferrovia que foi absorvida pela EFS em 1905 e desapareceu. O ramal foi desativado para passageiros em 1976. Há relatos de cargas, no entanto, passando por ele pelo menos até o início de 1980 - se isto for verdade, deveriam ser muito poucas. A verdade é que, depois que a Cia Paulista de Estradas de Ferro construiu também um ramal para Piracicaba partindo de Nova Odessa e passando por Santa Barbara do Oeste, em 1922, com bitola larga e mais próximo de São Paulo, com trens diretos, sem precisar haver baldeação com havia pela Sorocabana (em Jundiaí), o ramal da Sorocabana, que já não era dos mais rentáveis, passou a ser considerado como um peso para a ferrovia. Milagrosamente, sobreviveu até 1976. E a provável principal razão de a estação de Capivari ter sobrevivido praticamente inteira e em razoável estado de conservação (comparado com várias outras estações pelo país afora) é justamente o fato de a decadência da cidade não ter verbas nem vontade política para demoli-la )o que teria sido uma pena). Ralph (www.estacoesferroviarias.com.br)
ResponderExcluirOlá, Ralph Mennucci Giesbrecht, você tem razão, a estação de Capivari é mesmo muito bonita - ou foi... Já faz algum tempo que estive lá, e não sei em que condições está agora, uma vez que, na ocasião, me disseram que havia um projeto para restauração e uso cultural.
ExcluirEm fins do Século XIX já se dizia que a construção das ferrovias em São Paulo por companhias que usavam bitolas diferentes (de modo que os trens de uma não podiam circular pelos trilhos das outras, e tendo como resultado prático as incômodas baldeações), acabaria criando problemas sérios de interligação, com a ocorrência provável de trechos pouco utilizados. E, como bem sabemos, a maior preocupação, em muitos casos, nem era o transporte de passageiros, e sim o de carga, com uma mercadoria em especial: o café, destinado a Santos, para exportação.
Agradeço a sua excelente colaboração. Apareça por aqui outras vezes...