quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

Caçando moscas

Se um sujeito é um tanto desocupado ou desatento, diz-se que anda "caçando moscas". Vou provar a vocês, leitores, que nem todo caçador de moscas - literalmente - tem falta do que fazer, voluntariamente ou não.
Foi no Século XVIII, quando Félix de Azara (¹), mandado pela Coroa espanhola à América para trabalhos de demarcação de fronteiras, resolveu fazer uma viagem entre Buenos Aires e Asunción. Ia a cavalo, sempre que possível, em pelota ou canoa, quando necessário. À altura de Corrientes, tomou conhecimento da existência de um senhor que contava já noventa e três anos. Contar, aqui, não é acaso, e nem força de expressão, conforme vocês, leitores, já vão descobrir.
O que haveria de especial com o tal homem? Bem, em idade avançada, era de todo independente, preparando a própria comida, além de ir, por si mesmo, buscar água e lenha. Não é por isso, contudo, que está hoje sendo apresentado aqui. Sobre ele, disse Félix de Azara: "[...] Se entretém com três livrinhos religiosos, em engordar galinhas, que, quando quer, abate com arco e bodoque, e em matar moscas e contá-las. No ano passado matou [...] nove mil setecentas e quarenta e nove." (²)
É provável que tão estrita contabilidade consumisse parte do tempo de nosso ancião. Ainda por relato de Azara, sabe-se que seus netos moravam nas proximidades. 

(1) Félix de Azara empenhou-se ativamente no estudo da natureza dos lugares da América por onde passou, e deixou escritos que são importantes para o conhecimento das condições da época.
(2) AZARA, Félix de. Viajes Inéditos de D. Félix de Azara. Buenos Aires: Imprenta y Librería de Mayo, 1873, p. 47. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.


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