Esta postagem, leitor, é para você treinar sua "percepção histórica"!
Na revista semanal Jornal das Moças de 28 de dezembro de 1950 apareceu o seguinte anúncio:
Vão aqui algumas explicações: o Jornal das Moças foi uma revista voltada para o público feminino, e circulou semanalmente entre 1914 e 1965. Era editado no Rio de Janeiro que, na época, era a Capital do país. A despeito da linguagem e valores daquelas décadas, as temáticas abordadas não eram muito diferentes das de tantas outras revistas que circulam hoje (fofocas de cinema, cosméticos, moda, culinária, etc.). Entretanto, este anúncio é exemplar. Analisemos o caso.
- Primeiro, afirma-se que as vagas são para "uma profissão de fácil aprendizagem" e, imediatamente, acrescenta-se, "própria para moças" (quereria o anunciante dizer que uma coisa era consequência da outra?);
- Segue informando as facilidades ("fácil de aprender, simples de executar e dirigido por moças");
- Traz uma lista de outras vantagens e, finalmente, coroa a propaganda declarando que "as candidatas devem saber ler, escrever e as 4 operações sobre números inteiros".
Faço uma pausa para que você, leitor do sexo masculino, dê a habitual risadinha sexista. Não imagine, porém, que o nível médio de instrução entre a população masculina fosse muito diferente disso. Agora, continuemos.
Esse anúncio, como já disse, é de 1950. São, portanto, apenas sessenta anos, ou seja, tão perto de nós e, ao mesmo tempo, tão longe. Perto no tempo, longe no cenário socioeconômico. O que mudou?
Já há muito tempo não precisamos de telefonistas para fazer uma ligação que, às vezes, levava horas (ou dias) para ser completada. É pouco provável que alguma empresa séria anuncie vagas desse modo (mesmo porque, se fosse o caso, seria quase impossível atender a todos os candidatos, face ao atual cenário de desemprego) e os requisitos para o trabalho são, geralmente, bem maiores. Pode-se dizer, portanto, que mudou drasticamente o grau de desenvolvimento tecnológico, bem como o panorama do mercado de trabalho. Mas o que mais impressiona são as permanências.
Permanece a defasagem entre a escolaridade média da população e as exigências do mercado (e não estou falando em anos de escolaridade formal e em acesso universal à educação, campos em que houve, de fato, muito progresso, mas em real capacitação que se traduza em trabalho mais eficiente), permanece a diferença entre o que se paga para um homem e para uma mulher por idêntico trabalho realizado, permanece muitas vezes a discriminação no ambiente de trabalho e, embora já não seja necessário acenar com supostas vantagens para atrair a mão de obra feminina, permanece a jornada dupla e, às vezes, tripla, para a mulher trabalhadora.
Haverá mudança?
Quando?
Quando?
Espero que não sejam necessários outros sessenta anos para que futuras gerações de historiadores constatem a mudança que gostaríamos de ver agora mesmo.
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