"[...] um dia que a alma de uma velha nada pôde pescar e que se lhe negou uma esmola para seu sustento (²), o céu se irritou tanto contra a nação mocobi, que transfigurada em capivara a velha, teve que roer o tronco da árvore (³) por onde se subia ao céu até cair, cujo acontecimento causou um dano irreparável a toda a nação." (⁴)
História & Outras Histórias
História, preservação do patrimônio histórico e debate de questões atuais
Páginas
Pesquisar este blog
domingo, 19 de janeiro de 2025
Uma capivara roeu a árvore da eternidade
quarta-feira, 25 de dezembro de 2024
Blog História & Outras Histórias completa quinze anos
Amigos
leitores, chegamos, afinal, aos quinze anos deste blog. Quando postei o
primeiro texto, em 25 de dezembro de 2009, não imaginava que continuaria este
projeto por tanto tempo. Mas aconteceu.
Agora,
depois de mais de mil e setecentas postagens, a maior parte delas de interesse
permanente, surge a questão: Vale a pena continuar?
Tenho
pensado muito nisto ao longo de 2024. A ideia, no começo do ano, era encerrar o
blog assim que chegasse ao décimo quinto aniversário. Contudo, não sinto que
esteja pronta para o ponto final. Por outro lado, os leitores que me conhecem
“na vida real”, sabem o quanto está difícil encontrar tempo para escrever novos
textos. Assim, ao menos por enquanto, decido continuar, mas sem periodicidade
definida. Ou seja, o blog terá novas postagens sempre que for possível.
Agradeço
o apoio dos leitores habituais e eventuais, porque não seria muito útil gastar
tempo na manutenção de um blog que ninguém lê. Continuem a ler e comentar.
A
todos, desejo que este dia de Natal seja muito feliz, e vamos a 2025, para
descobrir o que o novo ano nos trará.
segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Escravos africanos trazidos ao Brasil entre 1842 e 1852
"1842 ........ 17.435
1843 ........ 19.095
1844 ........ 22.249
1845 ........ 19.453
1846 ........ 50.324
1847 ........ 56.172
1848 ........ 60.000
1849 ........ 54.000
1850 ........ 23.000
1851 ........ 3.287
1852 ........ 700" (³)
(3) DUQUE-ESTRADA, Osório. A Abolição. Brasília: Ed. Senado Federal, 2005, p. 32.
sexta-feira, 20 de dezembro de 2024
Traje de mulheres abastadas nos bailes e teatros durante o Primeiro Reinado
"No teatro e nos bailes, [as mulheres] aparecem com vestidos [...] cobertos de inúmeras flores e laçarotes de fitas, saiotes de cetim, corpete igual, bordado a ouro ou prata, rico diadema, flores e plumas nos cabelos em agradável combinação. As meias e os sapatos são sempre de seda. Neste ponto, o luxo excede a qualquer expectativa." (¹)O traje das damas que frequentavam a corte imperial era semelhante, porém com mais luxo:
"O traje de corte se assemelha a este (²), leve e transparente como o ar sob um céu abençoado. Um manto de veludo ricamente bordado em ouro e prata, um barrete com flutuantes penas de avestruz e um adorno de brilhante dão-lhe uma dignidade fantástica e imponente. [...]" (³)Quem vive no Século XXI pode achar tal moda muito estranha, mais condizente com uma fantasia de carnaval que com roupa de gente séria em ocasiões que requeriam traje de gala. Mudanças viriam, com certeza, e muito frequentemente, ao longo do Século XIX, quando as publicações francesas voltadas ao público feminino passassem a ser aguardadas com ansiedade. A "última moda em Paris" seria anunciada pelos lojistas que vendiam artigos de vestuário para mulheres que tinham recursos de sobra para tanto.
Contudo, nos dias do Primeiro Reinado, a extravagância estava em pauta, embora, quanto às joias das madames da Corte, Schlichthorst tivesse uma ressalva a fazer:
"[...] nem tudo que ao esplendor das velas lança raios multicores é diamante verdadeiro, porque em nenhuma parte do mundo nesse país dos diamantes se usam tantas pedras falsas" (⁴).
Traje de uma família brasileira no governo joanino (⁵)
(3) SCHLICHTHORST, C. Op. cit., p. 92.
(4) Ibid.
quarta-feira, 18 de dezembro de 2024
Venda de frutas na capital do Império
![]() |
Escravo vendedor (²) |
"As verduras eram poucas e limitadíssimas em variedades. As frutas estavam no mesmo caso. Flores ninguém vendia nem comprava, davam-se como davam-se e trocavam-se as mudas e sementes das que já se cultivavam; quais eram, além das do país? Não estudei a questão floriantiquária, mas que havia cultivo de flores, juro-o, porque havia senhoras." (¹)O correr dos anos, o crescimento e fortalecimento da cidade, a vinda temporária da Corte portuguesa ao Brasil, a Independência, trouxeram modificações significativas, tanto que Daniel P. Kidder, missionário metodista americano (³) que esteve no Rio de Janeiro durante o Período Regencial, pôde afirmar:
"[...] as frutas indígenas são muito variadas e saborosas. Além das laranjas, limas, cocos e abacaxis que são bastante conhecidos entre nós, há mangas, bananas, romãs, mamões, goiabas, jambos, araçás, mangabas e muitas outras espécies, cada uma das quais tem sabor e perfume peculiares.O olhar do estrangeiro que procurava pelas singularidades do país que visitava não deixou escapar o modo como os vendedores ambulantes de frutas atraíam seus fregueses:
Dispondo-se de tão grande variedade de frutas para atender os caprichos ou as necessidades da vida, por certo ninguém tem de que se queixar. Esses artigos são encontrados em profusão nos mercados e apregoados pelas ruas da cidade e dos subúrbios por escravos e negros libertos que os levam geralmente em balaios na cabeça. [...]" (⁴)
"[...] Os vendedores ambulantes passam constantemente pelas ruas apregoando em altas vozes a natureza e a excelência de suas mercadorias ou emitindo algum som indeterminado, apenas para atrair a atenção do público. [...]" (⁵)As condições de transporte no Brasil daquela época eram precárias, e frutas, como todo mundo sabe, têm uma vida útil bem curta. Deviam portanto, ser de produção local ou, no máximo, de pouca distância da capital do Império, para que pudessem chegar aos compradores em estado satisfatório para consumo.
Vendedor de frutas no Rio de Janeiro, depois do fim da escravidão e da Proclamação da República (⁶)
(4) KIDDER, Daniel P. Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil, trad. Moacir N. Vasconcelos. Brasília: Senado Federal, 2001, p. 89.
(5) Ibid.
segunda-feira, 16 de dezembro de 2024
Fome em Roma quando Nero era imperador
![]() |
Nero (¹) |
Nova falta de víveres ocorreu nos dias de Nero, que àquela altura, já era odiado até pelas pedras que havia nas ruas, em razão dos desmandos que fazia e por cuidar antes dos espetáculos que do sustento da gente romana. Novamente um navio vindo de Alexandria chegou ao porto, mas... Deixemos que Suetônio conte o incidente:
"Um acontecimento ao acaso contribuiu para aumentar o ódio contra ele [Nero], em momento no qual a população passava fome. Um navio chegou ao porto vindo de Alexandria, mas não trazia trigo, e sim areia para os gladiadores da corte." (²)A areia era usada para cobrir o sangue de animais e homens que lutavam em espetáculos públicos. Esperava-se trigo, contudo, já que o Egito era o grande celeiro do mundo romano. A amarga decepção, ao ver frustradas as esperanças por pão quando o navio entrou no porto, fez aflorar a ira das massas contra o jovem imperador, mais preocupado com lutas que com o estômago dos famintos romanos, que até gostavam muito de espetáculos, quando estivessem devidamente alimentados.
(2) SUETÔNIO, De vita Caesarum, Livro VI. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
sexta-feira, 13 de dezembro de 2024
Como a notícia do descobrimento do Brasil foi recebida em Portugal
![]() |
Dom Manuel, rei de Portugal (³) |
Embora haja pouca informação a respeito, no primeiro dos Diálogos das Grandezas do Brasil (¹), obra do começo do Século XVII (²), Brandônio explica a Alviano, seu interlocutor, que, de um fidalgo, ouvira informações muito interessantes:
"Esta província do Brasil é conhecida no mundo com o nome de América, que com mais razão houvera de ser pela terra de Santa Cruz, por ser assim chamada primeiramente de Pedro Álvares Cabral, que a descobriu [...], na segunda armada que el-Rei D. Manuel, de gloriosa memória, mandava à Índia, e acaso topou com esta grande terra não vista nem conhecida até então no mundo, e por lhe parecer o descobrimento notável, despediu logo uma caravela ao Reino com as novas do que achara, e sobre isso me disse um fidalgo velho, bem conhecido em Portugal, algumas coisas de muita consideração." (⁴)Note-se que Brandônio assumia a tese do descobrimento não intencional, mas isso não tem lá grande importância. Já mordido pela curiosidade, Alviano retruca:
"E que é que vos disse esse fidalgo?" (⁵)A resposta, expresse ou não a realidade do que ocorreu em Portugal diante da chegada da notícia do descobrimento, revela muito sobre os costumes da época, quando se desejava avaliar uma novidade como favorável ou infausta:
"Dizia-me ele que ouvira dizer a seu pai, como coisa indubitável, de que a nova de tão grande descobrimento foi festejada muito do magnânimo rei e que um astrólogo, que naquele tempo no nosso Portugal havia de muito nome, por esse respeito levantara uma figura, fazendo computação do tempo e hora em que se descobriu esta terra por Pedro Álvares Cabral, e outrossim do tempo e hora em que teve el-Rei aviso de seu descobrimento, e que achara que a terra novamente descoberta havia de ser uma opulenta província, refúgio e abrigo da gente portuguesa [...]." (⁶)Não quero roubar a graça das conclusões que vocês, leitores, poderiam já ir tirando, mas é preciso dizer que até hoje há controvérsias quanto ao verdadeiro dia em que a esquadra de Cabral chegou ao Brasil, mesmo havendo relato razoavelmente detalhado na Carta de Caminha. Mas, pondo de lado essa preocupação, considerem a última observação de Brandônio, quanto à suposta "profecia" relativa ao futuro do Brasil, e notem o horror que transparece nas palavras de Alviano:
"Não permita Deus que padeça a nação portuguesa tantos danos que venha o Brasil a ser o seu refúgio e amparo [...]." (⁷)Não, senhor Alviano, Portugal não precisou e não precisa de amparo. Mas, quanto a refúgio, certamente o Brasil o foi, ao menos para a realeza que aportou no Rio de Janeiro em 1808, bem como para a multidão de imigrantes que chegou aos portos brasileiros nos Séculos XIX e XX, provenientes não só de Portugal, mas de quase todo canto deste mundo. E continuam eles, os imigrantes, a vir para aqui, de outras terras que não aquelas do passado, porque este planeta, afinal, vive em ebulição, e a gente que nele habita precisa, às vezes, mudar de endereço.
(1) Autoria atribuída, com razoável probabilidade, a Ambrósio Fernandes Brandão.
(2) Os Diálogos foram escritos, portanto, mais de um século após o descobrimento "oficial" em abril de 1500.
(4) BRANDÃO, Ambrósio Fernandes. Diálogos das Grandezas do Brasil. Brasília: Edições do Senado Federal, 2010, p. 57.
(5) Ibid., p. 58.
(6) Ibid.
(7) Ibid.