quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

E se Papai Noel, em lugar de deixar presentes, levasse os sapatos?

Nicolau de Mira foi um bispo que viveu entre os Séculos III e IV. Daí a ser chamado Papai Noel houve um longo e acidentado caminho, não completamente entendido. 
O ser humano "de carne e osso" não era o que poderíamos classificar como um modelo de serenidade: à semelhança de muitos clérigos de seu tempo, Nicolau gostava de um debate doutrinário que, às vezes, degenerava em comportamento pouco apropriado para religiosos. Isso era moda em seus dias, e as pessoas ficavam tão entusiasmadas com essas discussões quanto hoje ficam os fãs por suas equipes de futebol preferidas.
Apesar disso, Nicolau de Mira (ou, se quiserem, São Nicolau) ficou conhecido por suas preocupações pastorais em favor das crianças que viviam em sua área, especialmente as que eram pobres. Talvez tenha brotado daí a tradição que, depois de voltas tão numerosas que dariam uma espiral, acabaria chegando ao velhinho gorducho, sorridente, com longas barbas brancas e traje vermelho, que corta o céu do Natal em um trenó puxado por felizes renas do Polo Norte. Convenhamos: nessa história, o capitalismo se esmerou.
No Brasil de outrora as crianças ouviam que seus presentes eram trazidos pelo Menino Jesus. Aos poucos, São Nicolau foi encarregado do assunto, e hoje não há menino ou menina que não espere por presentes encomendados ao "bom velhinho", devidamente pagos pelos pais, tios e avós. Ficou fácil para Papai Noel, ainda que seja pouco provável encontrar quem acredite nele. Apesar disso, ainda é argumento eficiente para crianças malcomportadas: "Olhe que Papai Noel não vai trazer seu presente de Natal!..." (¹)
Pois bem, voltando ao Brasil de antigamente, recordemos que, ao entardecer da véspera de Natal, era costume que as crianças colocassem seus sapatos na janela ou em outro local visível, aonde iam, na manhã seguinte, procurar os presentes (²). Aos poucos, essa tradição, como muitas outras, desapareceu.  E se Papai Noel resolvesse, em lugar de deixar presentes, levar os sapatos? Ora, leitores, que maldade! Nem pensar em uma coisa dessas... 
De qualquer modo, quando a economia não vai bem, os sapatos sofrem e têm a aposentadoria adiada, sabe-se lá para quando. Vejam, à direita, um cartoon que apareceu na revista carioca O MALHO, edição de 22 de dezembro de 1923. A legenda diz:
"JECA - Esse sapato é meu, Papá Noel.
PAPÁ NOEL - Eu já sabia. Reconheci pelos buracos." (³)
Alguém tem dúvida de qual seria o melhor presente para o Jeca?

(1) Portanto, leitores, se Papai Noel não anda generoso com vocês, agora já sabem o motivo.
(2) Na maior parte do Brasil, as casas não têm lareiras (não são necessárias), daí o costume já abandonado, mas que foi muito comum, de colocar os sapatos das crianças junto a uma janela, à espera dos presentes de Natal.
(3) O MALHO, Ano XXII, nº 1110, p. 35. O original pertence à BNDigital; a imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.


Veja também:

2 comentários:

  1. O Pai Natal é uma figura bonacheirona, simpática, mas que só faz sentido porque a mensagem natalícia original se esvaiu, há muito, no tempo, circunscrevendo a crença ás crianças. O capitalismo sabe mesmo o que faz!

    Tenha um bom final de semana, Marta :)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sim, pode não ter nascido com o capitalismo, mas caiu como uma luva para quem faz do Natal a maior oportunidade comercial de cada ano. O sentido original da data anda precisando de um resgate.

      Excluir

Democraticamente, comentários e debates construtivos serão bem-recebidos. Participe!
Devido à natureza dos assuntos tratados neste blog, todos os comentários passarão, necessariamente, por moderação, antes que sejam publicados. Comentários de caráter preconceituoso, racista, sexista, etc. não serão aceitos. Entretanto, a discussão inteligente de ideias será sempre estimulada.